Eles se conheceram na primavera quando tudo era mais feliz e colorido. Nas
ruas as árvores brilhavam em flor. Ele sorriu para ela. Pediu desculpas quando derrubou
o sorvete sujando toda a camisa. Ela disse que não era nada demais. Saíram
juntos e se divertiram. Ela nunca tinha sido mais feliz na vida. Ele era tudo o
que ela sempre sonhou.
Foi num verão que se casaram. Vestida de branco ela entrou na igreja.
Todos os amigos e familiares choravam. Enquanto seu pai a levava ao altar não
aguentou. Chorou também. Disseram sim e se beijaram durante toda lua de mel.
Parecia que a felicidade nunca teria fim.
Era outono quando as dívidas chegaram. A casa nova era meio cara de se
sustentar. Para isso trabalhava até tarde em dois empregos. Já ele se sentia
inútil por estar desempregado. O cachorro deles fugiu quando entravam pelo
portão. Um carro passou por cima dele. Brigaram até tarde da noite. Ele foi
embora batendo a porta e ela chorou abraçada no travesseiro. Chorou até as
lágrimas secarem e o cheiro dele sumir dali.
O inverno corria quando ele voltou. Estava bêbado e fedorento. Não era
mais o mesmo de antes. Não ajudava, não ria, só bebia o dia inteiro. Quando ela
desagradava ele a agredia. Perguntava a Deus até quando isso iria durar. Durou
até ela ir parar em um hospital. Cinco pontos na testa e um braço quebrado. O
que o laudo não dizia era que seu coração também estava partido.
Foi numa primavera que ela criou coragem, juntou todas as coisas que
conseguiu e saiu de casa sem avisar. Deixou para trás o dinheiro e os documentos.
Lembrou de levar a esperança. Mudou para a casa de uma amiga. Tratou de curar
os machucados e o coração. Reaprendeu a confiar. Só não aprendeu a amar de
novo. Isso ainda era um bocado difícil.
É verão novamente. Se você olhar pela janela vai vê-la passando. Quem vê
seu sorriso nem imagina o que aconteceu. Não carrega raiva, rancor ou ódio.
Reaprendeu a amar. Só não encontrou alguém que mereça o seu coração. Ainda. Não
tem medo. No lugar dele nasceram novos sonhos. Caminhou pela calçada até chegar
à sorveteria. Pediu o de sempre e partiu.
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